Benefícios da própolis
Pesquisadores da Unifran e da USP avaliam efeitos na recuperação da mucosite em pacientes com câncer de cabeça e pescoço
Fernando Joaquim
Foto acima: Própolis é produzida pelas abelhas a partir da seiva das árvores e serve para proteger as colmeias (Banco de imagens)
Pesquisadores da Universidade de Franca (Unifran), em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), conduzem estudos sobre os benefícios da própolis brasileira como auxiliar no tratamento dos cânceres de cabeça e pescoço. O objetivo principal é diminuir o incômodo causado pela mucosite, que compromete a mucosa oral como resultado de sessões de radio e quimioterapia, aumentando a sensibilidade e alterando o paladar, o que faz com que o paciente não se alimente corretamente.
Os tratamentos oncológicos têm se diversificado em muitas vertentes nos últimos anos. São novas vacinas e novos tipos de medicamentos que focam no combate aos tumores. Mas, entre eles, está também a busca por alternativas que melhorem a qualidade de vida dos indivíduos. Como já vem sendo usada em pesquisas, a própolis, produzida pelas abelhas para revestimento e proteção das colmeias, tem sua importância reforçada. Suas propriedades anti-inflamatórias, antimicrobianas, cicatrizantes, antioxidantes e anestésicas, além da capacidade de estimular a produção de colágeno, validam a aplicação em diversas áreas da saúde.
A cada ano, cerca de 40 mil novos casos de cânceres de cabeça e pescoço são diagnosticados no Brasil. Eles correspondem a, aproximadamente, 6,5% de todos os tipos de tumores malignos do país. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), devem ser registrados, de 2020 a 2022, uma média de 625 mil novos casos por ano. Os de cabeça e pescoço não estão entre os de maior incidência, tanto em homens quanto em mulheres, mas seu tratamento causa, geralmente, muitos desconfortos – entre eles, na alimentação.
Nos laboratórios da Unifran, segundo Silvio Almeida Junior, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Promoção de Saúde, a própolis vem sendo estudada com possibilidades de trazer benefícios mais rápidos aos pacientes. Foi escolhida para os experimentos devido a um projeto temático aprovado pela FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo) e coordenado pelo Prof. Dr. Jairo Kenupp Bastos, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP em Ribeirão Preto.
Quatro pesquisadores da Unifran estão envolvidos nos estudos: Prof. Dr. Sérgio Ricardo Ambrósio, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências, responsável pela extração, purificação e formulação da própolis brasileira; Prof. Dr. Ricardo Andrade Furtado, docente do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal, que tem experiência em inflamações; Profa. Dra. Regina Helena Pires, do Programa de Pós-Graduação em Promoção de Saúde, que auxiliará na avaliação do possível potencial antifúngico dos pacientes tratados com o gel de própolis brasileira; e Profa. Dra. Fabíola Pansani Maniglia, também do Programa em Promoção de Saúde, que auxiliará na condução das intervenções, contatos com a área de oncologia da Santa Casa de Franca e orientação da tese de doutorado de Silvio.
Santa Casa
De acordo com Silvio, a pandemia não comprometeu a pesquisa, que, em ensaio clínico da fase I, vai testar a toxicidade em pacientes – antes, no laboratório, a própolis já foi avaliada em algumas linhagens celulares. A pesquisa deverá resultar num produto farmacêutico certificado por normas internacionais e pela legislação brasileira. “Depois de atestar a segurança, vamos aplicar em pacientes que receberam tratamento de quimioterapia associado a radioterapia para tumores de cabeça e pescoço, avaliar regressão do processo de mucosite, incidência e prevalência, além de infecções fúngicas associadas”, explica Silvio.
Os pacientes a serem testados são os da Santa Casa de Misericórdia de Franca, onde o projeto foi aprovado pela comissão de Ensino e Pesquisa. “A pesquisa caminha bem e, no momento, está sendo realizada a formulação de uma pasta gel”, afirma Silvio. Essa pasta de própolis será aplicada durante as intervenções do projeto. “Sabemos que o tratamento de tumores tem evoluído. Apesar de a ciência enfrentar problemas, como falta de investimentos nos últimos anos, nossos cientistas não têm medido esforços para colaborar e avançar nas pesquisas”, completa o pesquisador, que avalia com otimismo o andamento do estudo. Embora os experimentos com a mucosite ainda não tenham começado, ele acredita, com base na realidade positiva trazida pela literatura médica, que haverá resultados para os pacientes em cerca de 12 meses.
Ainda para Silvio, o avanço da ciência mostra que as universidades têm mão de obra altamente qualificada, seja em instituições públicas ou privadas. “Acredito que a ciência é uma fonte da qual todos deveriam beber. Acreditar nela e, por consequência, em seus cientistas, das mais diversas áreas, poderia levar a sociedade a um patamar que ainda não conhecemos. Eu, ao ingressar na Graduação em Biomedicina, nunca imaginaria estar em um Doutorado, conduzindo ensaios clínicos em uma instituição particular no interior de São Paulo. Acredito que somos capazes de realizar grandes façanhas.”
A própolis
Não há dados precisos sobre a produção de própolis no Brasil, mas estimativas dão conta de que o volume anual fique entre 150 e 200 toneladas, o que coloca o pais entre os três maiores do mundo em extração e processamento do produto. Dois terços são exportados, principalmente para países asiáticos. O interesse externo, sobretudo desses países, aumentou com a desvalorização da moeda brasileira.
A maior produção está concentrada em Minas Gerais. O tipo mais comum no país é o marrom, que se origina de muitas plantas e é encontrado facilmente em farmácias, seguido pelo verde, derivado do alecrim do campo. O vermelho, de uma planta conhecida popularmente como rabo de bugio, é o mais raro, mas há potencial significativo para ampliar sua obtenção, principalmente em estados com alta concentração de manguezais.