Prática do Jornalismo

Tecnologia no campo

O agrojornalismo é fundamental na compreensão sobre as mudanças na agricultura e o impacto que elas provocam nas pessoas

Karollyna Basques

Foto acima: Estudantes captam imagens em visita do Prêmio Abag (Karollyna Basques)

Mesmo com a ideia de que o maquinário “tirou o emprego de diversos trabalhadores”, a introdução de novas tecnologias no campo elevou o nível de produção em quantidade e qualidade e trouxe maior equilíbrio ambiental. O plantio e a colheita se tornaram mais responsáveis, ajudando a preparar o terreno para as gerações futuras.

Não bastasse isso, os trabalhadores de antigas funções puderam se capacitar e ganharam outras colocações, aprimorando seu conhecimento e melhorando suas rendas. Cenário em acordo com as exigências internacionais mais rígidas. Diversos países passaram, a partir de protocolos recentes, a evitar a compra de produtos que não seguem as práticas consideradas corretas, socialmente e ambientalmente falando.

Pensar no fator humano, tanto aquele que trabalha para produzir quanto o que consome o alimento, é fundamental para que o Brasil tenha condições de assumir a posição que se espera dele no planeta, o de provedor de comida, e continue a sustentar sua balança comercial, amparada primordialmente no agronegócio.

Práticas manuais, que forçam o operário a condições muitas vezes degradantes de trabalho, ainda existem, mas perseveram em territórios menores e, aos poucos, vão sendo extintos, a partir também de acordos, firmados no próprio País e entre diversas nações, que levam em conta condutas humanitárias e ambientais em sintonia com a oferta de produtos do agro cada vez mais saudáveis.

Nesse sentido, a tecnologia tem papel de protagonismo. Com ela, desenvolvemos diversos aspectos de nossas vidas, sejam pessoais ou profissionais. Ela nos estimula, também, a buscar, continuamente, a inovação. No campo, apesar dos desafios que ainda enfrentamos, como a falta de infraestrutura e logística adequadas para a distribuição da produção, avançamos de forma inquestionável.

Com passar dos anos, por exemplo, surgiram máquinas de colheitas impensáveis até poucos anos atrás, o que abriu espaço para o crescimento da produtividade e para a requalificação profissional. Somam-se a isso outras questões, como o fim da queima da cana-de-açúcar, que reduziu a quantidade de poluentes lançada na atmosfera e substituiu o questionado e polêmico corte manual, em que boias-frias se submetiam a um sol escaldante para tirar da terra até 14 toneladas de cana por dia.

Na Usina São Francisco, preocupação não é com “o que”, mas “como” se planta (Foto: Karollyna Basques)

Na Usina São Francisco, em Sertãozinho-SP, o lema “o que faz a diferença não é o que se planta, mas, sim, a forma que se planta” sintetiza as mudanças de procedimentos nas áreas produtivas. Não basta ter o alimento. É preciso cuidado com as condições em que ele é obtido. Condições estas que priorizam o solo, a água, outros recursos naturais, bem como a integridade de quem trabalha e de quem busca o alimento.

Não dá pra negar que o homem ainda recebe a tecnologia com receio no campo. Habituado a métodos tradicionais de cultivo, ensinadas pelos antepassados, ele precisa, gradativamente, se inserir nos ambientes tecnológicos, que ditam e vão ditar o ritmo das nossas vidas pelos próximos anos. Se não adotar novas metodologias, corre o risco de perder competitividade e até de ter que abandonar a agricultura.

É preciso lembrar, porém, que o conhecimento é cumulativo. E que as práticas adotadas até hoje não podem simplesmente ser descartadas. Elas não impedem a emergência das plataformas digitais, mas se somam. Ou seja, não basta que o computador forneça todas as informações sobre uma lavoura se o produtor não consegue interpretá-las. Saber, de cor e salteado, a época certa do plantio, o quanto a chuva desta semana ajuda a semear e quando colher permite decodificar, com maior eficácia, o que é apontado pela máquina.

O próprio desenvolvimento de um novo equipamento passa por procedimentos que os agricultores mais antigos conhecem bem. Entre eles, um bom planejamento. “É preciso ser produzido, primeiro, manualmente, desde o molde das peças, até todo o processo de montagem, fase de testes e a finalização do produto, para que possa, enfim, ir para a terra”, explicou o técnico agrícola Weverton Baviera, em palestra realizada na Usina São Francisco durante o ciclo de visitas do Prêmio Abag de Jornalismo 2018.

Foi com base na dedicação absoluta dos nossos agricultores que o Brasil se tornou o primeiro produtor de café do mundo e o primeiro exportador de açúcar, frango, carne bovina e soja, entre outras conquistas. Isso com o País ocupando apenas 9% de seu território. Ou seja, retira muito alimento de uma pequena porção de terra, se levado em consideração o tamanho do território nacional. Internamente, não restam dúvidas sobre a pujança da agricultura tupiniquim. E, no restante do planeta, tal reconhecimento deve também acontecer, já que caminhamos para isso.

Temos, portanto, de um lado, a vontade de produzir. De outro, tecnologia disponível para dar conta das demandas por alimentos no mundo. O que falta então? A resposta não parece ser tão complexa. Faltam medidas para que essa tecnologia seja incorporada ao campo. Tanto nas grandes áreas como nas pequenas. Tanto nas fazendas como nas propriedades familiares. Para os maiores, a adesão parece mais fácil. Mas aos pequenos e, consequentemente, sem recursos adequados, falta um crédito mais generoso, e com condições que caibam no bolso. A resistência à tecnologia, quando ocorre, talvez nem seja teimosia. Mas dificuldade de acesso.

Para Luiz Cornacchioni, diretor executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), uma bem pensada política de crédito é apenas um dos fatores que vão impulsionar o campo brasileiro nos próximos anos. Ele cita, também, a necessidade de novos acordos internacionais, além da preocupação com transporte e armazenagem. Nesse último quesito, temos enfrentado um sério problema: as altas taxas impostas sobre o petróleo resultam em aumento nos preços dos combustíveis, a patamares que muitos não conseguem bancar. Vejamos o que tem acontecido no Brasil, motivando a paralisação dos caminhoneiros e comprometendo seriamente o abastecimento.

Se o combustível usado para transportar o produto tem valores inviáveis, o custo se estende para o valor dos alimentos. Isso sem contar os gastos pra abastecer as máquinas usadas para plantar, fazer os tratos culturais e colher.

Nesse aspecto, mais uma vez o Brasil é privilegiado. Domina as tecnologias para a produção de biocombustíveis, menos poluentes e renováveis, e cogera energia a partir de resíduos do processamento de matérias-primas, contribuindo na redução da cota de poluentes.

Para estender os benefícios de uma produção de alimentos saudável e sustentável ao mundo, não basta, porém, reunir todos esses fatores citados se eles não forem bem comunicados. O agrojornalismo tem função estratégica, funcionando como uma lupa para as novidades e diretrizes do campo: desde o aproveitamento do conhecimento das gerações passadas, passando pelos gargalos, até a aplicação da tecnologia em prol do ser humano.

Mais que isso: ao prestar atenção nessas questões, o jornalismo apresenta uma visão mais sistêmica, já que a área urbana também necessita e quer fazer parte do agro.

Açúcar orgânico e cogeração de energia aumentam leque nas usinas (Foto: Karolllyna Basques)