Cidades sustentáveis

Patrulha ambiental

Incomodada com falta de cuidados em área de preservação, moradora de Franca cria projeto que envolve a comunidade   

Júlia Paiva

Foto acima: Crianças prontas para ajudar a melhorar bairros onde vivem: lições de cidadania   (Divulgação)

Depois de observar o filho limpando um terreno baldio ao lado de casa, Úrsula de Oliveira, moradora do bairro City Petrópolis, em Franca, se sentiu incomodada. “Eu morava perto de uma área de preservação permanente e depositavam muito lixo ali. Estava virando um lixão. Eram entulhos de construção e resíduos diversos. Meu filho mais velho, Pedro, juntava com os amigos e limpava o que conseguia.”

Somavam-se a isso as reclamações da vizinhança sobre os animais peçonhentos que se espalhavam pelo local. Movida pela vontade de trabalhar com causas sociais, convocou toda a comunidade. “Chamamos todos os moradores, os amigos dos meus filhos, os vizinhos, todos que estavam aqui em volta para podermos catar o lixo. E, nesse mesmo tempo, pedimos o apoio da Secretaria de Obras e Meio Ambiente”.

Pedro conta que, de início, se envolvia nas ações de limpeza despretensiosamente, pelo fato de o lugar ser muito bonito. “Depois eu viajei e minha mãe sentiu a necessidade de cuidar também. Quando voltei, fiquei surpreso com o projeto, que havia se estendido para a comunidade. Mas nunca imaginei que minha mãe faria esse projeto. Fiquei orgulhoso dela e de saber que minha ação contribuiu com isso”.

Após o mutirão, Úrsula percebeu que o meio ambiente não envolvia só lixo. Nem apenas árvores e plantas. “É o lugar que a gente habita, com o qual interagimos. Vi que muitas coisas precisavam de intervenção”. Nascia, ali, em 2018, a Patrulha do Meio Ambiente, um projeto que tem, como objetivo, além de reduzir o descarte de lixo, a educação ambiental e a restauração de áreas de preservação ambiental, praças e nascentes.

O nome veio da necessidade de patrulhar, observar, cuidar, autocuidar. “É um autocuidado, né? Quando você evita que um monte de resíduos seja jogado inadequadamente, evita doenças e acaba cuidando de você mesmo. Está se preservando no momento em que cuida do meio ambiente.”

Mas era necessário que outras pessoas soubessem disso. E tivessem a chance de uma educação para o autocuidado. “Buscamos informações na Secretaria do Meio Ambiente e, a partir daí, começamos a divulgar”.

Crianças e adultos se envolvem na coleta de lixo em áreas de bairros de Franca (Foto: Divulgação)

No terreno da primeira ação, o lixo já diminuiu. “As pessoas têm cuidado, a prefeitura mantém o local na medida do possível. Foi muito bom, porque chamou a atenção da comunidade para algo que a gente esperava que a prefeitura fizesse, que um vereador fizesse. Mas nós é que arregaçamos as mangas e fomos.”

A causa gerou eco. Tanto que a Patrulha já tem feito trabalhos em outras regiões da cidade. A revitalização em uma praça do Jardim Paulista foi pedida pelos próprios moradores do bairro.  “A praça era muito bonita. Tinha aparelhos de ginástica, mas estava virando depósito de lixo. E, sempre quando alguém nos convida, a gente organiza e vai. Na verdade, o que queremos é despertar o cuidado nas pessoas. Aquela coisa assim: vamos cuidar do que é nosso, do que está em volta, sem esperar que alguém faça pela gente”.

O projeto não recebe aporte financeiro. A ajuda da Secretária de Obras e Meio Ambiente vem em forma de placas, coleta de lixo, podas de árvores e algumas revitalizações. “Tudo é feito com muita garra e algumas parcerias. A gente faz bazar e compra sacos de lixo, por exemplo”.

Mas o projeto quer mais. “A partir do momento que tivemos consciência desse espaço que ocupamos, que classificamos o meio ambiente como o meio em que a gente vive, e que, para estar bem naquele meio, precisamos não só de uma área de preservação limpa, passamos a demandar arte, cultura. Além dos mutirões, fazemos várias ações nesse sentido, para que a gente possa aplicar a educação ambiental às crianças”.

Patrulha do Meio Ambiente começou em 2018 e vem se expandindo (Foto: Divulgação)

Infância e meio ambiente

Vendo as iniciativas, o Centro Comunitário do City Petrópolis e do Jardim Ipanema convidou a Patrulha, em junho de 2019, para usufruir do espaço. Foram pensadas oficinas de reciclagem e recreação durante as férias. Úrsula acredita que trabalhar as questões ambientais com as crianças pode melhorar a visão dos adultos. Para ela, a infância é a esperança de mudança para o mundo. A Patrulha usa brincadeiras, organiza ações de plantio e cultivo. “São ferramentas diversificadas para alçar as crianças, porque logo elas serão adultas. Se não aproveitarmos o momento, fica mais difícil”.

Segundo Ícaro, o filho mais novo de Úrsula, que sonha em ser biólogo, a recreação é importante, pois se pode aprender mais sobre o meio ambiente de forma divertida. “Eu gosto também dos mutirões e tudo que envolve a Patrulha. Me sinto lisonjeado em fazer parte.”

Ariane Angélica Bueno, moradora do City Petrópolis, também participa com os filhos. Quer vê-los fazendo parte de uma iniciativa que visa ao bem-estar do bairro. “Nas férias, ao invés de ficarem no celular, eles vão para a recreação, o que é muito bom. Brincam, fazem culinária, bordado, pintura, o que ajuda não só nos cuidados com o meio ambiente, mas no desenvolvimento das próprias crianças.”

Para Úrsula, a educação ambiental que os atuais adultos tiveram é mais pragmática. E precisa ser mais abrangente. Começar em casa, na alimentação, no descarte do lixo. “A partir do momento em que você trabalha isso, vai poder ter um adulto capaz de preservar do jeito que precisa, da forma que é necessária”.

Devido à pandemia de Covid-19, o projeto não promove atividades que geram aglomerações. Os mutirões de limpeza são feitos, de acordo com Úrsula, com todos os cuidados exigidos: distanciamento, poucas pessoas e uso de máscaras. Com as crianças, a Patrulha planeja atividades online. Entre os assuntos discutidos, as queimadas durante o tempo seco.

Em Franca, entre o início de maio e 17 de julho, foram registradas 171 ocorrências de queimadas, conforme o Corpo de Bombeiros. Aumento de 36,8% em relação ao mesmo período do ano passado. “Explicamos que algumas são criminosas e seus malefícios, não só por trazerem destruição por onde passa, mas para a saúde”.

Atividades de recreação ajudam no desenvolvimento de crianças da comunidade (Foto: Divulgação)