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Estudos apontam que extrato da jabuticaba pode proteger contra distúrbios associados ao ganho de peso e ao câncer de próstata

Heloísa Taveira

Foto acima: Fruta é nativa da Mata Atlântica e bastante apreciada no nosso país (Divulgação)

A jabuticaba, fruta de origem brasileira, vem sendo, há alguns anos, objeto de estudo de pesquisadores do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O motivo é que, além de características curiosas, como a de brotar no caule, o extrato presente em sua casca apresenta efeitos benéficos à saúde, que podem ser disponibilizados no mercado, em forma de suplementos alimentares, ainda em 2020.

Em parceria com a Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp, os professores Marcos Roberto Maróstica Júnior e Valéria Helena Alves Cagnon Quitete coordenaram um grupo de estudiosos e constataram que o extrato pode ser eficaz contra o câncer de próstata e no combate ao aumento do colesterol.

As duas situações podem estar ligadas diretamente ao envelhecimento. Durante essa fase, há uma deficiência de controle no nível de glicose no sangue, um aumento na deposição de triglicerídeos no fígado e desequilíbrio hormonal. É comum que os idosos apresentem dislipidemia (colesterol aumentado), hiperinsulinemia (taxa maior de insulina no sangue), diabetes e doenças cardiovasculares. “Além disso, há um índice elevado de lesões prostáticas, particularmente relacionadas com o avanço da idade”, diz Valéria.

Festival Gastronômico da Jabuticaba marca início da colheita em Casa Branca, capital da fruta em SP, com 22 mil árvores (Foto: Divulgação)

A partir dessa observação, os pesquisadores iniciaram um experimento com camundongos em processo de envelhecimento, a fim de avaliar o limite da dose do extrato para promover os benefícios desejados. Foram 60 dias de uma dieta rica para proporcionar ganho de peso e aumentar a gordura no fígado, tempo suficiente para que os animais desenvolvessem pré-diabetes e alterações hepáticas.

Cerca de 70 camundongos participaram do experimento, no qual foram separados por grupos. O teste foi esquematizado de forma que alguns recebessem dietas padrão; outros, dietas ricas em gordura; e outros, diferentes dosagens do extrato. A intenção é que fosse descoberto, também, se uma dose mais alta do extrato poderia ser mais eficiente, comparada à dose menor.

O resultado foi bastante positivo. Foi constatado que o produto da casca da jabuticaba na dieta dos animais envelhecidos preveniu o pré-diabetes. O experimento conseguiu impedir o ganho de peso, diminuir o processo inflamatório, reduzir a hiperglicemia (excesso de açúcar no sangue), aumentar os níveis de HDL (colesterol bom), melhorar a morfologia do fígado e diversos outros benefícios. As dietas com doses maiores foram mais eficazes.

Os pesquisadores perceberam que houve uma diminuição do estresse oxidativo e da inflamação da próstata. Esse equilíbrio levou a uma melhora tecidual e molecular do órgão. “Assim, o extrato poderia ser indicado como um coadjuvante no tratamento de lesões proliferativas, como o adenocarcinoma (tumor maligno) de próstata”, relata Valéria.

O consumo

Apesar de o estudo ainda não estar concluído, já existem planos para fornecer um suplemento alimentar para farmácias de manipulação e para uso industrial. A pesquisa gerou uma patente que foi licenciada pela startup Rubian Extratos, graduada pela Incubadora de Empresas de Base Tecnológicas da Unicamp.

O produto é uma aposta no bom desempenho e no baixo impacto ambiental. A formulação aproveitará os resíduos descartados pela indústria alimentícia, utilizando as cascas das jabuticabas destinadas à produção de sucos e geleias.

Produtores de Casa Branca esperam produção de 600 a 1.000 toneladas na safra deste ano (Foto: Divulgação)

O diferencial da tecnologia se baseia no aspecto nutracêutico – que surge da combinação dos termos “nutrição” e “farmacêutico” – do produto. Valéria destaca que, além de os estudos realizados em laboratório mostrarem grande eficácia, não foram evidenciados efeitos colaterais. “Com as dosagens que utilizamos, tempo de tratamento e modelo experimental animal, não identificamos contraindicações”.

Por isso, a expectativa é que, logo, suplementos feitos com casca de jabuticaba estejam nas prateleiras à venda. “Nosso calendário está considerando entrarmos no mercado no último trimestre de 2020. Todavia, com a pandemia da Covid-19, estamos avaliando o impacto e não temos uma decisão confirmada, pois, em alguns aspectos, dependemos de parceiros na cadeia produtiva”, afirma Eduardo Aledo, sócio-fundador da startup.

22 mil árvores

Além de estar repleta de componentes benéficos à saúde, a fruta é, geralmente, apreciada pelos brasileiros. Em Casa Branca, maior produtora de jabuticaba do estado de São Paulo, com mais de 22 mil jabuticabeiras, são realizados diversos eventos relacionados ao produto e, ao menos, 500 trabalhadores temporários são contratados em época de colheita.

O Festival Gastronômico da Jabuticaba costuma acontecer em setembro, mês que marca o início da colheita. Realizado em praça pública e aberto à população, o evento faz sempre sucesso com suas atrações culturais e culinárias. “Na praça de alimentação, todas as receitas são produzidas com a jabuticaba. Há uma variedade imensa de pratos, como geleias, sorvetes, bebidas e a venda da fruta in natura”, comenta Eliana Inocêncio Bittencourt de Lima, diretora de Turismo de Casa Branca.

O tradicional Festival da Jabuticaba no Pé também é realizado todos os anos, pela família Fagan, grande produtora da região. Organizado em uma fazenda com centenas de jabuticabeiras, atrai, em média, quatro mil visitantes, principalmente de São Paulo e Minas Gerais.

Diante da pandemia do novo coronavírus, a data ainda não foi confirmada. A produtora Ângela Fagan diz que a expectativa é que haja uma boa safra neste ano, mas que não pode desconsiderar possibilidades de prejuízo por causa das condições sanitárias. “O clima pode ajudar muito na colheita, mas há um suspense. Se o comércio não retomar até setembro, nós, produtores do município, podemos ter danos. O esperado é entre 600 e 1.000 toneladas de jabuticaba em 2020”.

Em estudo da Unicamp, casca apresentou propriedades anti-inflamatórias (Foto: Banco de imagens)