Ciência transformadora

Tratamento inovador

A aplicação de células-tronco, considerada um avanço na medicina humana, também é utilizada no tratamento de animais

Luciana Garcia

Foto acima: O veterinário Jean: células-tronco podem aliviar efeitos de doenças incuráveis (Divulgação)

Os avanços da ciência que melhoram a qualidade de vida do ser humano também podem ser vistos entre os animais. A Medicina Veterinária Regenerativa, área em que são utilizadas células-tronco, está cada vez mais desenvolvida e já possibilita tratamentos eficazes para doenças que deixavam sequelas ou podiam levar os animais à morte.

O uso dessas células como importante recurso terapêutico ajuda animais de diferentes idades, mas é comprovada maior eficácia em pacientes mais jovens e com graus menos severos de doenças.

Mas o que são as células-tronco?

Antes de tudo, é importante entender que as células são componentes microscópicos que formam os tecidos e órgãos. São essenciais para manter o bom funcionamento do nosso corpo.

As células-tronco, especificamente, possuem a capacidade de se autorrenovar e de dar origem a células diferenciadas, como neurônios, hemácias, células musculares e de pele. Elas podem ter origem embrionária ou não embrionária, sendo que, no último caso, são mais limitadas e com menor capacidade de diferenciação.

Rex, que é de Ribeirão, fez tratamento em Botucatu (Foto: Divulgação)

A competência das células-tronco de se transformarem em diferentes tipos de tecidos (ossos, sangue, nervos, músculos) possibilitou o desenvolvimento de tratamentos para uma série de doenças, como as neurológicas degenerativas, cardiovasculares, traumas na medula óssea, entre outras.

Por essa capacidade de autorregeneração, essas células podem ser usadas na medicina regenerativa, isto é, são fundamentais na recuperação de alguns tecidos lesionados. Porém, elas não eficazes em todos os casos. Isso acontece quando algumas lesões são mais complexas, como o câncer, que faz com que as células-tronco do órgão danificado percam sua capacidade de regeneração.

Em animais
Como em humanos, o tratamento com células-tronco em animais já é uma realidade. Além de ser usada como um recurso de reparação tecidual, a terapia celular também “regula o fluxo de algumas substâncias, como citocinas e moléculas regulatórias”, explica o médico veterinário e coordenador científico do Instituto Bioethicus de Botucatu-SP, Jean Joaquim.

Para ele, o campo desse tratamento é extenso, abrangendo diversas patologias. “Sua aplicação clínica é ampla, podendo ser útil em casos de medicina interna, como doenças renais, hepáticas, ampliando-se cada vez mais sua indicação para as lesões do sistema nervoso e para as lesões do sistema osteoarticular, em conjunto com a reabilitação.”

Ainda de acordo com o veterinário, o tratamento é oferecido aos animais que sofrem de várias doenças, como é o caso das hepatopatias, doença renal crônica, doença articular degenerativa, além das sequelas de cinomose, que foi o caso de um dos seus pacientes, o cachorro Rex, um vira-latas.

Cãozinho foi adotado com tetraplegia por Regiane (Foto: Divulgação)

Rex foi adotado em 2015 com tetraplegia (sequelas de cinomose) pela administradora executiva Regiane Vieira, de Ribeirão Preto-SP. Desde o início, ela procurava tratamentos que pudessem amenizar estes efeitos da doença. “Levava o Rex semanalmente para fazer tratamentos com acupuntura e fisioterapia, mas, durante o processo, fiquei incomodada em vê-lo dessa forma e não se movimentar.”

Pelas mãos de Jean, o cão começou o tratamento com células-tronco e passou por 19 aplicações, sendo que, na quarta, houve uma melhora significativa na parte cognitiva e no equilíbrio. “O tratamento do Rex foi feito via epidural, devido a lesão dele ser no sistema nervoso central. Ele teve um impacto muito grande no sistema nervoso devido ao vírus da cinomose, que causa necrose nessa área.”

Como é feita a aplicação?
Por ser uma técnica natural, isto é, utiliza-se de células produzidas pelo próprio organismo, é segura, tem poucos efeitos colaterais e, geralmente, é pouco invasiva. Tudo começa com a coleta das células-tronco mesenquimais, que podem ser encontradas na polpa dos dentes, na medula óssea ou no tecido da barriga no animal. Logo após, é preciso fazer a manipulação e, quando são submetidas a uma solução de nutrientes, são armazenadas durante três semanas para se multiplicarem.

Essas células são injetadas, pelo menos, em uma a três sessões, diretamente na região machucada do animal. Ao longo da recuperação, elas vão se transformando em células do organismo, regenerando os tecidos danificados da área injetada. Para Jean, é uma terapia que pode ser a solução para doenças conhecidas como incuráveis nos tratamentos convencionais. “É a natureza sendo utilizada pela ciência para cura do organismo induzida pelo próprio organismo.”

Quanto custa o tratamento?
Apesar da sua evolução, Rex acabou tendo um bloqueio na melhora, pelo fato de a contratura muscular ter sido muito severa em decorrência da cinomose.

Regiane ainda conta que, “infelizmente”, o custo do tratamento com as células-tronco provocou a suspensão da terapia. “Já faz um ano que o Rex não está fazendo mais a terapia celular. O custo é alto e, no momento, estamos optando pela fisioterapia duas vezes na semana.”

Os custos variam de R$ 1 mil a 2.500 por aplicação. Na Unesp de Botucatu, existe um serviço com custo menor, devido à produção das células serem feitas na própria universidade: R$ 500 a 650 por aplicação.

Depois de 19 sessões, Rex precisou ter tratamento suspenso devido aos custos (Divulgação)