Mudança de hábitos
Cada vez mais brasileiros, como as francanas Camila Fernandes e Samira Cândido, aderem a uma alimentação sem carnes
Lorena Resende
Foto acima: Samira Cândido considera egoísmo comer carne (Acervo pessoal)
Camila Fernandes e Samira Cândido Cordeiro, ambas moradoras em Franca, se autodenominam “ovolactovegetarianas”. Elas não consomem nenhum tipo de carne, o primeiro passo para que se tornem “veganas”.
Esses termos são cada vez mais falados na sociedade. Um crescimento que tem ocorrido, principalmente, na última década, não só no Brasil, por causa da maior preocupação com a causa animal.
As duas foram, aos poucos, mudando seus hábitos alimentares conforme ampliaram os conhecimentos sobre como funciona o abate. “É um grande egoísmo da nossa parte matar um ser vivo, ainda mais para alimentar nossos próprios prazeres”, afirma Samira.
Camila concorda. “Pensar no outro, para mim, é pensar na vida, que é direito do ser vivo. Não preciso me alimentar do sofrimento e da dor dos animais. Penso que seria hipócrita acariciar a minha gata enquanto, no meu prato, pousa um peixe assassinado e ainda dizer que sou amante dos animais. Isso não é amor, isso é egoísmo”. E completa: “O amor é abdicar da zona de conforto e assumir uma posição social enquanto cidadão responsável pelo bem-estar do nosso planeta e de todos os seres que nele habitam. É sobre a empatia, o poder de se colocar no lugar do outro que sente e sofre assim como você.”
Novo estilo
O estilo de vida delas é parecido com o de outras 29,2 milhões de pessoas que já declaram não consumir carne no Brasil, segundo pesquisas recentes, número que corresponde a 14% da população nacional.
Além dos ovolactovegetarianos, como Camila e Samira, existem os lactovegetarianos, que não consomem carne e ovos, os vegetarianos estritos, que evitam qualquer alimento de origem animal, e os veganos, que não só não ingerem, mas também não vestem e não usam quaisquer produtos de beleza ou de entretenimento que tenha a ver com os bichos.
Mudar o que vai à mesa, no armário ou no guarda-roupas, no entanto, demanda alguns cuidados. O primeiro é procurar um nutricionista, para que a transformação na rotina seja feita aos poucos. A diminuição da carne começa devagar. Uma vez por semana, depois duas, até zerar, para que o processo não seja repentino.
Adaptação
O estudante de nutrição Vinícius Henrique Pereira afirma que muitos encontram dificuldades nessa transição, principalmente na adaptação à convivência com pessoas que continuam a consumir carne. Eventos em família e saídas com os amigos pode virar, para alguns, uma “tortura”. Por isso, na opinião de Samira, é preciso estar realmente preparado para a mudança.
Para ela, existe outro inconveniente. A falta de lugares para comer. “Não tem muitas opções. Há uma exclusão grande com a gente. O número de locais que oferecem a alimentação que procuramos é bastante restrito. É uma questão cultural, porque o Brasil ainda é um país que produz muita carne para outros países.”
De fato. Nas carnes bovinas, o Brasil é dono do maior rebanho do planeta (mais de 200 milhões de cabeças), sendo considerado o maior exportador mundial. Em relação às carnes de frango, é o segundo maior produtor, atrás dos Estados Unidos, mas fechou o ano passado como maior exportador. E, para as carnes suínas, ocupa a quarta posição no globo, tanto em produção como exportação.
Há prós e contras numa alimentação que evita carnes. Entre os benefícios, segundo os adeptos, estão a queda na ingestão de gorduras e a diminuição no impacto ambiental gerado pelas pastagens. O nutricionista explica que, de maneira geral, os vegetarianos apresentam riscos menores de desenvolver sobrepeso/obesidade, doenças cardiovasculares, hipertensão, diabetes, câncer e outras doenças que podem comprometer a qualidade de vida. “Estudos mostram que indivíduos vegetarianos têm menor prevalência em diversos tipos de câncer.”
Por outro lado, as carnes são fontes importantes de proteínas e outros nutrientes, que, se não complementados, podem fazer falta na dieta. Um deles é a vitamina B12. “Com o decorrer dos anos, mesmo que demore, os vegetarianos podem desenvolver a deficiência dessa vitamina se não houver a suplementação. Por isso, deve-se tomar cuidado, principalmente com as mulheres grávidas. A vitamina B12, nesse caso, deve ser suplementada em cápsula vegetal. Mas, seguindo as orientações de um nutricionista, dificilmente vai haver deficiências”.